segunda-feira, 7 de maio de 2012

Essa lua.


                                                                         Foto by: Chico Passos

Quando olho-te assim nua e branca,
sem pudor, exposta publicamente aos ventos
das noites quentes do norte...
essa canção, esse vinho, esse cheiro de mar,
me tens enternecido como o diabo.

(Dimitre Padilha – aos 05/05/2012, sábado e primeiro dia de lua cheia).

Quimicamente.




A paixão nada mais é do que um dedo na ferida
acompanhado de doses regulares de morfina,
anfetamina, serotonina e anti-inflamatórios.
E nessa diária paradoxal química, um simples
olhar de ressaca pintado com sombras e
sorrisos oculares, ensejam poemas homéricos.

(Dimitre Padilha – aos 05/05/2012)

sábado, 21 de abril de 2012

Amor-Paixão.



Amor é música clássica,
paixão é jazz, tango.

Assim, amo quando a brisa
em clara noite perfumada
abranda o mar, e os corpos
mornamente entrelaçados
adormecem vigiados pela lua.

Quando paixão, os ventos mudam,
entra a viração, o leste devastador.
O mar apesar de azul é revolto,
lua cheia, tempestades solares,
e os corpos não se entrelaçam, fundem-se
um ao outro, numa ânsia de sede incurável.

O amor é outonal, é um sereno
caminhar por sobre folhas secas,
é entardecer-se.

Paixão é criação volátil, é um matar-se
dentro de si a cada instante, em revoltadas
ondas primaveris.

A paixão é o amor criança.


(Dimitre Padilha – aos 18 dias de Abril)

sexta-feira, 20 de abril de 2012

A Poesia.




Era bom saber dos olhos,
da música, dos suspiros,
do vinho derramado
sobre seus panos...
a pele, a língua, o hálito morno
escapado por entre seus dentes,
possuindo toda minha insônia.

Hoje sua ausência me
faz mais presente de mim
e distante do ludismo da noite,
lua, música e nostalgia...
dos inebriantes desejos do eu e você,
simplesmente.

O dia me tens cansado,
grudado aos livros,
dedicado aos dessabores
fáticos do mundo,
à maestria imposta aos juristas,
trancafiados e mortos a cada dia...
renascidos a outros.

Agora, à noite, em Pasárgada,
o cigarro não me deixa,
o malte, a cerveja, inspiram-me
dedilhar palavras soltas ao violão
enquanto mulheres de olhos aliciadores
exalam perfumes misturados.
Onde ainda sou poeta.

Amanhã não me terás profano,
ausente  ou amputado de mim,
já não habito a caverna de Platão,
e há muito são outras as minhas paixões,
são outros os desejos que ensejam
lágrimas ou despertam cólera espartana.

Os olhos pueris 
a que me viram os teus,
sempre hão de enxergar
a imensidão do meu ser
entre espelhos paralelos,
e dentre tantos aqueles que sou,
sempre haverá um seu.

(Dimitre Padilha – aos 10 dias de Abril de 2012)

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Produtor de Miragens.


O poeta é acima de tudo um profeta beduíno
que avista entre os grãos suspensos
em redemoinho de areia, imagens produzidas
pelos manifestos desejos do Eu.

(Dimitre Padilha)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Intimamente.


Abismei-me em mim
quando do alto dos olhos,
saltei despido de paliativos
temores que indicam o fim.

Saltei, enfim.

Abeirado ao paredão de pedra,
com as unhas cavei crateras
adentrando um mar profundo
de onde descubro o cheiro do meu Eu
à hora do susto.

Encharquei-me de mim.

Absorto, pairado no mar,
reconheci buracos, estrume, lama,
raras bromélias, endêmicas orquídeas
e espinhos que agridem elas.

Meu Eu é o mar,
o mar dos antigos.

(Dimitre Padilha, em revoltadas ondas de verão)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Pés descalços.

Pés descalços renegam a boca
À medida da rigidez da coluna.
Os vejo com os olhos da lembrança
Transportando-me à infância.

Cheiro de lavanda e alfazema,
Talco que liberta a pele
Da maciez aderente do tecido.
Aquecido, alimento-me de minha mãe.

Cheiro de lavanda inglesa
Dos pêlos do peito de meu pai
Cantarolando músicas autorais.
Sem etiquetas, arroto cheiro suave de vida.

No berço encontro meus pés,
Em especial o dedão, que de tão macio,
Afaga-me as gengivas e dentinhos.
Mordo até dormir.

Que saudade dos meus pés.

(Dimitre Padilha, com lágrimas de saudade)

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Meramente Eu.


O ventre é um reino despótico mornamente
acolhedor de nossas angústias espirituais.
O parto, o momento que descobrimos
a solidão e o frio vazio do mundo.

Hoje sou cigarro e vinho,
Eu e meu Eu, sangrando em diálogo
noturno de veras constatações:
o humano coração move-se sozinho.

(Dimitre Padilha, gripado e refletido)

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Condenación




Quem sentenciou este homem
esculpir seus caminhos?
A moldar a rocha que esconde
seu rosto ao espelho?
Por que há de ser Aleijadinho
antes de ser poeta?

É pássaro amputado
de asas, revelando   
a nudez de sua alma
consumida pelo vazio
dos becos do dia.

Quem dirige aquele que
Deus extravia?

(Dimitre Padilha – em diálogo noturno).

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Cinco Poemas Noturnos.


Poema para a noite.

Apago as luzes e vejo você.
São seus olhos de gata no telhado da casa
Miando canções inebriantes
Grunhindo unhas, lambendo a pele Cigana.

Sua música é mantra repetido em ondas
Afastando o sono, e mesmo dormindo,
Sinto o cheiro do meu reflexo
Vozes que ecoam de um passado nunca vivido

Vejo-te em minha pele que exala seu cheiro
Entranhado nos lençóis e travesseiros.

Atiro-me janela afora, pulo o muro
Para te encontrar.



Poema sobre a noite.

Acordes menores com nonos acidentes
Saídos dos espaços entre seus dentes
Ecoam na brisa dos lábios da lua
Regidos em escalas flamencas seminuas

Roucos trovões de tempestades solares
E ela, a lua, invade todos os lares
Deflorando impiedosamente
A fonte de volúpia que existe na gente.

Notas dissonantes em ritmo acelerado
Misturam-se ao cheiro noturno
Da gata no telhado.

Abraço a noite por todos os lados.



Poema na noite.

Acorda amor que é noite ainda
Sente o cheiro que vem da janela
Soprados desgraçadamente pela lanterna
De errantes comorientes.

Vem olhar a noite amanhecer
Ouvindo o silencio dos astros
Que pulsam com um único
Dos seus abraços.

Beija-me, vicio meu,
Cuida desse peito,
Afasta a angustia saudosa
Do cheiro seu

Rege essa orquestra desorganizada.




Poema com a noite.

A madrugada chegou, e eu parti antes
Com a ilusão de marinheiros errantes
Que enxergam nos olhares do dia
Aquilo que não vicia.

Parti e voltei embriagado
Pelo ilícito cheiro
Dos teus abraços e seios.

Entrelaçando-me à noite aliciadora
Perdido entre suas pernas e cabelos,
Encontro no cheiro, pelo faro,
Tudo aquilo que sou e faço.

Vejo a noite como um espelho.



Poema da noite.

Encontro contigo na noite nua
Vigiada pela lua
Iluminando de desejo
Tudo o que vejo.

Retiro-a da cabeça e a tenho nas mãos
Nas pontas dos dedos,
Língua, lábios e cotovelos
Afastando a solidão.

Acaricio seu corpo e beijo seu braço
Passando as unhas próximo à boca
De onde a noite retira sua prece
Com acordes embriagados
Unidos à fumaça dos meus cigarros.

Três sedutoras mulheres,
(A noite, a música e a lua)

Devoram-me sem talheres.


(Dimitri Padilha)

domingo, 14 de junho de 2009

Viver ao seu lado.


“Morri! E a Terra - a mãe comum - o brilho
Destes meus olhos apagou!... Assim
Tântalo, aos reais convivas, num festim,
Serviu as carnes do seu próprio filho!”


Aos que choram às Vozes dos Túmulos.


Sentir a cor na dor que afeta,
Traz o sabor insípido à minha boca aberta.
Bocejo noturno transmutado em insone incerteza.
O que serei na manhã que espera?
Música, sonho e primavera?
Caixão, túmulo e vermes?

Fecha-te, boca do inferno, não pensa
Afasta-te desse quarto escuro,
Há humor na espera dos vermes
São tantos pratos e talheres
Que à hora da Ultima Ceia,
Degustam-nos rasgando aos dentes
Sem etiqueta e cortesia, em
Arrotos, flatos e grosserias.

Onde está a poesia dos vermes
Senão em comer a prostituta e a freira,
O alcoólatra e o atleta,
O servo e o fidalgo,
Sem orgias ou religiosidade,
Bebedeiras ou atletismo,
Servidão ou fidalguia,
Todos num único prato,
Com os mesmos dentes afiados.

Sentir a dor na cor que espera
Torna prematuro o parto do escuro.
Andamos de braços dados com ela,
Não há o que chorar,
Nos resta viver.
Carpe Diem, senhores.

(Dimitri Padilha)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Caminhos.


À Sávio Drummond, poeta e cidadão impar no mundo.


Um dia chego lá, senhores.
Como cheguei às trompas de minha mãe,
Encontrando a outra parte perdida entre tantas
Que aguardaram, e foram descartadas.
Mas estes lugares, amigos, senhores,
Não são como os que imaginam,
Sempre veludosos e reluzentes
Nem, muito menos, medidos
À pó de ouro e sobras de cifrões.
São outras as minhas paixões,
Outras as fontes de tristeza
São outras canções que despertam o coração.
Este lugar, dentre tantos que vou passar
Requer botas grossas para os pedregulhos,
Braços longos para os adeuses,
Estomago forte e olhos atentos
Pois os sentimentos falam e resvalam,
Afloram em revoltas primaveris
Devastando de vida o corpo inteiro.
Escafandrista, mergulho em mim,
Nas mais escuras trevas. Vejo,
Ao fundo dessa caverna inundada,
Uma luz desenhada pelo sol,
Trazendo à tona uma alma
Nunca antes perdida.

Hei de fecundar-me, senhores.

(Dimitri Padilha, em frio conquistense).

terça-feira, 5 de maio de 2009

Eu passarinho.


05/05/2009


Passarinho leve como vento
Caminha sobre nuvens
Encantando pensamentos
De quem segue com a brisa
Nessa vida louca, esvaída,
Descansa no meu dedo
Dedica-me uma canção
Arranca este pranto,
Costurado em solidão.
Leva-me às nuvens,
Cola estas asas em meus braços
Faz-me passarinho como tu,
Quero voar, preciso voar,
Invadir todo esse azul
De mãos dadas com você
Onde não possam nos ver
Subamos para o alto,
Para o além do alto
Cair do baixo não me agrada
Subamos sem medo
Além das nuvens
Para o imensamente alto,

(Dimitri Padilha)

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Entre uma vida e outra.

Quando somos adolescentes acreditamos na existência do sempre, do imutável, da transparência, da realização dos sonhos, e, sobretudo, da verdade na amizade. Á medida que nos tornamos adultos, vamos descobrindo o lado obscuro das pessoas; suas fraquezas, recalques, medos, duvidas, desvios de caráter e tudo mais que, durante a miopia da imaturidade, não pudemos enxergar. Nosso ego é enorme, talvez inflado por nossos pais, por filmes e livros. Mas não somos Napoleão ou Buda. Não escrevemos como Ernest Hemingway. Não temos a força de Leônidas, nem mesmo somos espartanos; e ficamos revoltados com isso. Mas somos impotentes ante tal descoberta. Com o tempo descobrimos outros caminhos e desejos, procurando enxergar o lado simples e objetivo da vida. Aprendemos que os defeitos nos tornam mais humanos e que com eles crescemos. Então passamos a experimentar sensações, gostos doces e amargos, amores canalhas e reais, pessoas que nos completam ou destroem e mesmo assim pomos os dedos na chapa em brasa para sentir que estamos vivos. Assim seguimos este eterno curso de erros.
Pessoas passam por nossas vidas; em determinado momento foram indispensáveis, como aquele amor imensurável que hoje é um quadro de Monet, expressando o mais puro e inocente que existia dentro de nós, porém sem realismo algum, mas somos reais.
Pensávamos ser impossível existir sem determinados amigos, e continuamos vivos, mesmo estando mortos dentro de nós. Outros, ou, talvez, somente um, continuou existindo (era bom saber disso). Mas nossas vidas, entre idas e vindas, foram tomando cursos diferentes, outros são os nossos oceanos, outros são nossos sóis. Éramos amigos e pouco a pouco nos tornamos desconhecidos um ao outro, num processo de especiação já declarado por Darwin, que começa num isolamento de idéias e princípios, depois num geográfico. Mas não importa que assim o seja, não vamos procurar esconder ou calar, como se isso fosse motivo para nos envergonharmos. Assim é a vida.
Podemos nos cruzar, talvez, e celebraremos uma festa como tantas outras o fizemos, não como antes, não como os mesmos, pois a amizade ficou aprisionada no passado, numa foto de diário. Mas foi preciso nos tornar estranhos, porque era essa, talvez, nossa lei, e é por isso que nos devemos mais respeito e consideração, para que a idéia de nossa antiga amizade não se torne uma farsa, anulando alguns anos de nossas vidas ou fazendo com que sejamos cegos, surdos e mudos. Então acreditemos em nossa antiga amizade como algo á parte do que aprendemos com os tropeços e tapas na cara, fora dos conceitos deste mundo louco. Mesmo se tivermos de ser inimigos aqui na terra. Porque a vida é tão frágil e passageira, que não nos cabe o prazer da irracionalidade.

(Dimitri Padilha)

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Diário de um NAUFRÁGIO.



Sou este homem atormentado
Em sua jornada a procura
Do essencial para a vida,
Buscando na sabedoria
Das florestas um sentido real
Que faça renascer
Sem a angústia da excelência
Material, mas sim libérrimo
Das amarras que o prendem
Ao fundo do casco desse navio,
Naufrago que é em si.
Deixando marcas na areia cinza
Ele caminha em sua própria direção,
Num reencontro inconsciente.
Vestido de si mesmo,
Corre sem pudor
Ao encontro do mundo
Pois teme, à hora da morte,
Saber que não viveu.

(Dimitri Padilha)

segunda-feira, 30 de março de 2009

Sem fisiologismo e com volúpia.


Uma gota de chuva toca-me a cabeça
Numa rua onde passa uma mulher.
Desce a testa alcançando o rosto
E ela anda inebriante em mim.
Cinza, o dia caminha colorido a sua volta,
Levando-me a pensar nele que faz poetas viverem.
Anda em câmera lenta deixando visível seu aroma
Em névoa que ressoa dos poros direto ao peito,
Doído do saudosismo de sua presença na rua,
Segundos de fuga do caos do mundo.
A gota passa do rosto ao pescoço evaporando-se
E logo outras chegam a ensopar os cabelos
Arrepiando, unidas ao vento, a pele,
Que deseja essa mulher na rua.
Notórios são seus finos pêlos nas pernas
Levantando-se ao menor sinal do frio
Escapando por entre rasgos propositais
Do jeans que cobre o resto, e chove,
Entorpecido, permito-me andar sem pressa,
Ao ritmo dos seus passos.
Nas mãos Baudelaire, talvez Balzac,
Realçando de cérebro seus lábios
E olhos semi-abertos pintados
Com sombras de desprezo.
De repente surge uma curva.
Ela, sem titubeio, abandona a rua,
Deixando como remédio
Um sorriso que devasta a mente
Num mantra inconsciente.
Eis que reaparece a vida dura.

(Dimitri Padilha)

sábado, 28 de março de 2009

Fonte da vida.


À Ubaldina Carvalho Cruz, minha avó querida.

Caminho perdido em floresta medieval,
Adentro, mais sinto os sons do início,
Vendo com olhos familiares, etérea miragem,

Este homem na linha do tempo, mimetizado
Entre folhas secas caídas em solo enriquecido
O sangue corre branco nos longos troncos,
Capilares copas enverdecidas de luz que resvala
Retornando ao globo ocular iludido pelo córtex.
São outonais visões de infância perdida entre galhos,
Genealogia de restos mortais transmutados em árvores.
Mais adentro, penetro em mim mesmo
Apresentada pelo espelho dos rios
Essa imagem irreconhecível do rosto que tenho
São pedaços falecidos de gente que ainda vive
Nos braços, pernas e tantos carbonos inalterados,
Decaindo a cada nascimento.
Rachados vasos nodosos de minha avó
Sangrando em Carvalho apodrecido
Mata fechada fechando ciclo
Vejo-me nos decompositores bichos
Sendo refeito a cada milênio
Numa mistura sem ritmo.

(Dimitri Padilha)

segunda-feira, 2 de março de 2009

Poema de páscoa.

Ao amigo Dorival Filho.
Pousas em meu rosto uma mosca.
Faminta, lambes meu sangue
Sedenta, matas meu suor.
Es minha existência precipitada a pó.
Bactéria pré-natal
Incubada na fecundação
Esse câncer que desperta prematuro
Anunciador do futuro.
Hoje sou voz e pensamento
Contato e redenção.
Amanhã serei lama, vento,
Um cipreste crescendo
Nesse Eterno Retorno do carbono
Quem sou não sei mais.
Serei essa voz diária desde que me conheci
Que fala sem som?
Quando ela cala ficamos mudos de existência?
Para onde vai a consciência na ausência das sinapses,
Senão para o chão, completando o ciclo da matéria?

(Dimitri Padilha).